terça-feira, 10 de agosto de 2010

Páginas folheadas

Por Fernanda Câncio

«Conhecer alguém. Aprender alguém. Achar que se conhece - que se sabe dessa pessoa, quem é, o que pensa, o que sente e como, de que é e não é capaz. Dizer: sei quem és. Pensar: sabes quem sou. Confio em ti. Confia em mim. Pôr a mão no fogo. Pôr tudo no fogo. E pensar, enquanto se põe: e se for um erro? Pôr tudo no fogo sabendo que é quase smepre um erro. Esperar. Esperar que não seja como quase sempre, esperar que seja como quase sempre. Às vezes é difícil perceber o que se espera, aquilo em que se aposta. Talvez se aposte apenas, a partir de certa altura, em acertar. Quer dizer: em ter errado. É mais seguro, esperar pela certidão do engano. Uma espécie paradoxal de seguro, o de antecipar o desastre (...)


Philip Roth
«Erramos sobre as pessoas antes de as encontrarmos, enquanto antecipamos o encontro; erramos enquanto estamos com elas; e depois vamos para casa e contamos a alguém como foi o encontro e erramos de novo. Como o mesmo sucede com as outras pessoas em relação a nós, a coisa acaba por ser uma deslumbrante ilustração vazia de qualquer sentido, uma espantosa farsa de mal-entendidos. E que havemos nós de fazer quanto a este terrivelmente significante assunto que são as outras pessoas, assim esvaziado significado que achávamos que tinha e parecendo-nos antes caricato, tão completamente incapazes somos de penetrar os íntimos e desejos uns dos outros? Será que temos todos de desaparecer e trancar a porta e sentarmo-nos isolados como escritores solitários, numa cela insonorizada, convocando pessoas através da escrita e fazendo de ocnta que essas pesssoas feitas de palavras são mais reais do que as pessoas verdadeiras que desfiguramos com a nossa ignorância de todos os dias? A verdade é que a vida não é acertar no que as pessoas são. Viver é errar sobre as pessoas, errar, errar, errar e depois, voltando a pensar cuidadosamente sobre o assunto, errar outra vez. É assim que sabemos que estamos vivos: erramos. Talvez o melhor fosse esquecer isto de acertar ou errar no que às pessoas diz respeito e limitarmo-nos a deixar-nos ir. Mas, claro, sortalhudo o que conseguir fazer isso.»


(...)


O momento em que desistimos de nos enganar - nesse momento estamos mortos.


(...)


Errar, errar, errar, então. É o que temos, não há mais nada. Mas com paixão, nunca desistindo. Não porque um dia esperemos acertar, não. Mas porque nunca nos habituamos à ideia.»

1 comentário: